Por Redação

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Um relatório recente da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC) cobrou do Brasil a adoção de medidas mais rígidas para prevenir a lavagem de dinheiro em escritórios de advocacia, um tema que há anos enfrenta resistência dentro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
O documento, divulgado após análises realizadas no primeiro semestre de 2025, avalia como o país tem implementado as diretrizes da convenção, da qual é signatário desde 2006, ainda no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Entre as principais recomendações, está a regulação das obrigações de advogados e outros profissionais jurídicos no enfrentamento a operações financeiras ilícitas.
Nos últimos anos, investigações policiais apontaram o uso de escritórios de advocacia como fachada para movimentações ilegais, inclusive ligadas a facções criminosas. A ONU alerta que o sigilo profissional, embora essencial à defesa dos clientes, pode acabar sendo utilizado como mecanismo de blindagem para disfarçar recursos oriundos de crimes.
A Lei nº 9.613, que trata do crime de lavagem de dinheiro, é considerada ampla o suficiente para abranger advogados e cartórios na obrigatoriedade de registrar e comunicar transações suspeitas. No entanto, o relatório destaca que apenas os cartórios foram efetivamente incluídos nesse tipo de regulação. “Não há regulação equivalente para advogados”, diz o texto.
A OAB, em nota, reiterou sua posição histórica de defesa do sigilo profissional, afirmando que ele é comparável ao adotado por advogados nos Estados Unidos e no Reino Unido. “Sem esse sigilo, não há direito de defesa assegurado. O advogado é o profissional do cidadão, e esse é mais importante do que o Estado”, afirmou a entidade.
A última tentativa de regulamentar o tema ocorreu durante a gestão de Felipe Santa Cruz (2019–2022). À época, uma comissão presidida por Juliano Breda elaborou um estudo para propor diretrizes internas de prevenção à lavagem de dinheiro na advocacia.
O texto, concluído em dezembro de 2020, mantinha a dispensa dos advogados de comunicar ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) informações sobre clientes e serviços prestados, mas previa responsabilidade disciplinar para profissionais envolvidos em repasses ilegais de valores sob o pretexto de honorários. Também propunha que advogados que participassem de operações como compra e venda de imóveis ou sociedades empresariais notificassem o Coaf.
A proposta, no entanto, foi rejeitada em 2021 pelo plenário do Conselho Federal da OAB. De acordo com Breda, os conselheiros entenderam que a medida poderia “representar um risco ao sigilo profissional e à confidencialidade da relação cliente-advogado”, além de abrir espaço para uma possível criminalização da advocacia.
“Pessoalmente, acreditava que as regras poderiam proteger os advogados, criando um padrão de conduta que evitaria responsabilizações futuras”, declarou Breda à Folha de S.Paulo.
A falta de regulamentação brasileira também tem sido alvo de críticas do Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi), principal organismo mundial de combate à lavagem de dinheiro. Em 2009, o país já havia sido repreendido pelo Gafi por não obrigar advogados a reportar transações suspeitas, descumprindo compromissos internacionais.
As diretrizes globais do órgão consideram a advocacia uma das profissões não financeiras mais vulneráveis à lavagem de dinheiro e reforçam a necessidade de normas que assegurem transparência nas operações sem comprometer o direito de defesa.

